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domingo, 6 de junho de 2010

POR UM FIO


Era analfabeta! Até que teve um ensinozinho, mas não passou da cópia do nome, que com o tempo esvaneceu! Cresceu arrancando caruá e no tempo do umbu já amanhecia na vereda. De ano em ano, ou lá um se acaso, em dia de festa, caprichava nas fitas e laços, decote e cintura. Por dez anos namorou um João, que vinha de ano em ano, no carnaval, se esconder no canto do curral pra lhe surpreender com um balde dágua, mas de gravata e tudo. Foi com ele, de jegue, morar na casa de taipa que a mãe dele tinha numa roça mais a oeste algumas léguas. Por anos a fio varreu terreiro, empurrando as lembranças da mocidade pro monturo. Raspou maxixe, mexeu aribé, limpou taxo, dobrou tapioca, encheu gamela com abóbora, moeu milho, fez angu, e encheu o coxo com lavagem para os porcos. Carregou pote dágua até de bucho e gemeu por cinco vezes à espera da parteira. Catou cafuné e piolho com a mesma ternura de fazer cochilar até homem feito. Nunca passou disso, até o dia em que a vaca Cumbuca caiu no riacho, no meio da enchente, remanso das águas engolindo o bicho e ela amarrou a saia em dois nós, atracou-se no cipó e enlaçou-se nos chifres do bovino empunhando frase poderosa: “ninguém pode mais que Deus”. A vaca morreu de velha, olhando agradecida para ela. E agora é ela, que em sua caduquice, fio de memória não para de lembrar-lhe aquela vaca, aquele dia, aquele feito! Depois que borrou-se tudo, parece que ela nasceu ali!

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