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quinta-feira, 21 de junho de 2012

DE ONDE VIM?


De onde vim, meu compadre, onde tudo teve início? Não. Não pense nunca, que venha eu do silêncio.

Tampouco vim do barulho, desse entulho de ruídos, que envadem nossos ouvidos todos os dias pagãos.

Eu vim mesmo foi da música, desde o choro de nascença, desde o canto de ninar, desde o cantarolar manso, nas noites do meu sertão. Euclidiano sertão. Euclidiano ou não!

A música é a a estrada que me trouxe, que me abriu tantas portas. Estrada que é, como toda estrada, naturalmente torta, como uma clave de sol. Constituída de sons, de tons, de bares e amigos, bandas de bolsos, bandas de lua… de versos e de seus avessos. Caminho que não tem preço, nem desculpa, nem perdão.

E cá estou, entre vós, para mostrar sem demora, a minha trilha sonora, que colhi nesta viagem. Se aqui faço paragem, é para colher neste instante, como todo bom caminhante, algumas sonoridades, que vossas presenças trazem.

Porque eu vim foi da música. E é para ela que eu volto!

Kleyton Nunes: De Onde Vim

Estética da sisudez juvenil



Eu não gosto de hiperbolismo poético. De poesia de xiliques! Não gosto dessa coisa exclamatória, recitativa, destinada a uma performance da revolta e do escárnio. Já gostei disso. Mas cansei! Isso se mostra como se se remetesse contra uma moral bem comportada, mas, no fundo, trata-se de uma estética eufêmica, cujos tons que se destacam são o lúgubre e o fúnebre, e uma opção pela razão escatológica, que no fundo só disfarça uma verve vitupérica e exprobrática: ao mesmo tempo que se auto-exclama, ofende.

No geral parece o ímpeto juvenil querendo desbancar o mundo e se impor agressivamente contra a prata da crina dos mais velhos. E contra suas experiências e sua suposta sapiência. Equanto isso eu prefiro a sutileza de um Manoel de Barros, que envelheceu para poder ser simples. E muito mais poesia! No fundo eu ando preferindo o allegro, ma non troppo, o tristi, ma non troppo. Via do meio é a que eu topo; veia do meio eu toco, estico o papo, se for preciso fumo o toco, mas não me venha com tanta sisudez, que eu dou um treco.

A PREVISÃO DO TEMPO


A previsão do tempo não sai da costa. Do litoral. Da capital. A previsão do tempo tem um quê de colonial. Disse que há previsão de chuva. Lá nele – pensei! Do fundo do coração. Aliás, do fundo do pâncreas, que é mais profundo e vive para equilibrar enzimas! Aprendi ontem, no Bem Estar. Lá nele!

Hoje tô com o ouvido apurado! Escuto esses sons das janelas balançando! Tudo balançando! Uma pancada aqui e outra ali. Janelas soltas. Querendo pular a janela e ir. Batem-se, se abatem e não conseguem voar. Janelas presas.

A mais veloz das janelas é a TV. É essa coisa disponível, ininterrupta, como uma cascata, ora com mais ora com menos torrente! E sempre com muita pressa. A gente vai lá e colhe. Apara aquilo e inunda a sala. Mas geralmente chove no molhado.

A previsão do tempo passou. Já esqueci. Eu mesmo vou avaliar se a chuva vem ao longe. Se vier agora é fina, sem estrondos, pedindo um pouco mais de pano sobre o corpo. Nem cheiro tem, forte, como aquela de outubro, novembro… ou quando der. Agora é só esse junho em maio. Correria de chuva aqui, nesse tempo, tem pouca chance. Porque aqui também chovisca aquela coisa fina que nem escorre. Coisa que nem faz descer riacho! Só serve para desembainhar casacos.

Mas na costa não. Na Zona da Mata, vez em quando, neste período vem uma avalanche. Os riozinhos espremidos pelas cidades caóticas, pelo caos urbano de todos os santos, pela pobreza sem eira nem beira na beira dos barrancos, espremida pela riqueza sem noção que é então maior pobreza… Os riozinhos rasgam o estreito, inundam as ruas, tombam para os escombros os patrimônios. Derrepente todos estão boiando, tentando alcançar alguma estaca para estancar o afogamento. Lá nele!

No sertão não! No sertão o couro encolhe, o queixo treme, e as pessoas aproveitam o propício para se aninharem umas nas outras. À noite – que de dia o sol racha! Há dias até em que é provável encontrar neblina nos baixados, de manhazinha. E esta terra torna-se seca e fria! E venta! Zombido nas soleiras, nos beirais! Pedaços de bagaço de tudo que é sujeira que nos dispomos a oferecer ao mundo – como nosso mais sincero e valioso depósito no comum – rodopiam, dançam, para constiruirem uma das principais iniquidades estéticas de nosso tempo.

Mas a previsão do tempo passa longe disso!