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quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

TARA

a verdade da brancura do papel,
esta virgindade sedutora,
intolerável!
a convidar-me para esvaziar um pouco o peso o ser,
a aliviar sobre ela a existência,
talhada por todas as precipitações

sou magro de fé e de coragem
quase um abstêmio, um estulto,
a desculpar-me sempre de mim mesmo

por isto tornou-se meu divã
esta brancura, resoluta, impiedosa!
à espreita, aí, como um devir
a devorar-me,
a exigir-me a confissão,
a seduzir-me sem esforço algum!

Pego, afago, esfrego
grafo, grito, groso, gozo, gosto de arranhá-la!
depois fumo meu cigarro e vou dormir

DESCOMPASSO

Meu coração desandou
Passo de seu descompasso.

Como uma ave sozinha,
Andorinha sem verão
No faz de conta da linha
Ave de pipa no ar
Quase a se soltar da mão

Quer voar o coitadinho!

Vou pendurá-lo, por fora
Como um piercing, no mamilo
Do lado esquerdo do peito
Dotar de realidade
Isso que não tem mais jeito

Balanço de todo dia
O samba que nunca pára
Um samba de ser sozinho!

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

O MESMO OUTRO

A embarcação é açoitada pelos seus motores, até que desencalha, desengata, desatraca. Eu permaneço estático. Não me comove se o mar não está pra peixe, pareço alguém que cuida só de suas escamas. Se chove, eu me recolho em minha bolha, e nem sei se ela bóia, se dilúvio. Permaneço um atávico atarracado, afinando o meu egoísmo de batráquio. Sou deste mundo: ele é minha escola! Aos poucos aprendo a arte da isenção, do distanciamento, e até durmo - um estrangeiro? - enquanto o mundo desintegra. Desperto sempre um pouco mais cruel, coração endurecido. Detenho-me nos noves-fora deste cálculo, até que a embarcação atinge a outra margem. E eu, embora outro, sou o mesmo - azedo! Talvez com um pouco mais de sofisticação.