Josemar da Silva Martins
Professor da UNEB/DCH III
Doutor em Educação
19 de maio de 2007. Iate Clube, Petrolina, Pernambuco. Show do Zeca Baleiro. No início, aquela expectativa, e aquela angústia por ver ali, do lado de fora, enquanto a fila andava, aqueles pitboys com seus carrões e seus porta-malas cheios de porcaria. Aliás, ali também encontrei alguém que se pergunta, como eu: porque quem gosta de música ruim (e há, sim, música ruim!) só consegue ouvir em último volume? Um tipo de exibicionismo simplesmente irritante. Esse culto do fuleiro como signo de valor.
Lá dentro, uma boa surpresa: ao contrário do que faz o Country Club, em Juazeiro, no show dos Paralamas do Sucesso, as mesas vendidas não tomaram totalmente a frente do palco e permitiram àqueles que compraram ingressos avulsos, compartilharem pelo menos um pouco o espaço do palco. Isso merece uma menção de razoável inteligência no planejamento espacial do show à equipe do Perna Longa.
Mas a graça mesmo veio do próprio show. Não apenas o tom rock in roll balançou a galera (essa palavra anda meio gasta, pelo uso abusivo que o Axé Music faz dela), mas a comunicação do Zeca com a platéia foi um diferencial. Em geral os artistas de renome que vem aqui, meramente dão “boa noite”, trocam o nome da cidade e dizem “obrigado, tchau!” no final. Engenheiros do Havaii, no Casarão, eu acho que nem isso pronunciou. E até Djavan economizou palavras nas duas vezes em que veio aqui. Certamente esses artistas não sabem como isso fornece um diferencial em termos de presença, de interação, para uma região já vapirizada pelas porcarias que se disseminam por aqui em todos os espaços, e que vive carente desses contatos. Com o Zeca foi diferente! Ele estabeleceu um contato alegre, descontraído! Segurou a onda quando a luz faltou por duas vezes (e poderia muito bem ter aproveitado para sair fora, pelo menos na segunda vez). Mas o público também segurou a onda, sem confusão, sem invasão de palco. Eu achei um puta show!
Mas há uma parte que considero particularmente significativa: não apenas os vários momentos de conversa, mas o momento em que Zeca Baleiro expressou sua opinião sobre o “fechamento” da indústria cultural em torno de estéticas como a do forró eletrônico, do axé e do pagode-bobagem, os três ícones da cultura da fuleragem. Sua defesa de uma abertura para a pluralidade cultural é algo que me soa corajosa – afinal, parece haver um pacto de silêncio em relação a isso, contra o qual nem nomes como Caetano Veloso parece disposto a pronunciar-se!
É uma pena que não pude entrevistá-lo, pois seria de muita importância seu depoimento em nosso vídeo “O Estado da Arte da Fuleragem” que o INOVE/UNEB está fazendo com apoio do BNB. De qualquer forma, há aqui outra constatação a ser feita: está cada vez mais claro que há público suficiente (mesmo aceitando os fuleiros entre esse público) para custear a vinda de outros nomes e outras estéticas da música brasileira para a região do São Francisco. Espero que os produtores de Juazeiro e Petrolina se dêem conta da asfixia que a mesmice do “forró putaria”, do “axé bobagem” e do “pagode fuleragem” estão nos ocasionando! Puta que pariu!
Um comentário:
O show foi tão bom que até hoje tô feliz: "baleiada", pra sempre :) Pena não termos nos visto por lá... Corcordo em QUASE TUDO que você expôs no texto, exceto no que diz respeito ao espaço reservado para o público que comprou ingresso avulso. Se comparado ao absurdo dos shows de Leoni e (bem menor) Paralamas, ambos no Country, foi válido. Mas esse é um detalhe importante que, acredito, deva ser melhor avaliado pelos organizadores da região. Lamentando mesmo a ausência da opinião de Zeca no vídeo - tinha-a como certa. E, ainda mais, não ter ido pra o Rei do Caldo depois do show, onde ele, segundo um amigo, estava se deliciando, como imagino que se considera: um simples mortal. Beijo grande!
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